quinta-feira, 17 de junho de 2021

Perdemos as crianças

Caminhamos pelas ruas desta cidade.

E ouvimos.

Ouvimos homens nas esplanadas.

Ouvimos martelos nas obras.

Ouvimos mulheres nas compras.

Ouvimos carros, motas e camiões.

Ouvimos cães a ladrar.

Às vezes, até conseguimos ouvir pássaros.

Mas onde estão as crianças?

Não vemos nenhuma, não ouvimos nenhuma.

Nos espaços públicos desta cidade,

Não há espaços de partilha intergeracional.

Não há encontros com crianças

Nem entre crianças

A cidade rejeitou-as.

A cidade despida de alegria

Aborreceu-as, destituiu-as.

Não as quer ver, não as quer ouvir.

E elas foram enclausuradas

Em casas-jaulas

Em escolas-prisões

Em horários de trabalho engaiolado

Banidas de todo o espaço público.

Que só é público para os adultos.

Bom, primeiro para os carros

Só depois para os adultos

Uma cidade vazia de crianças:

Crianças não votam no partido

Crianças não compram o local onde vivem

Então, que importa? Quem se importa?

O que é bom para o mercado

É mau para as crianças

É mau para nós

Cidades que não acolhem crianças com prazer.

Cidades sem uma comunidade completa, integral.

Cidades, todas as cidades.

Civilização mutilada, alienada.

Moribunda?


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